Resta dúvida sobre responsabilidade de instituição financeira

03/09/2015

Um ponto de controvérsia no programa de regularização de recursos no exterior é a responsabilidade atribuída às instituições financeiras que atuarem no processo. Pelo texto mais recente - um substitutivo do senador Delcídio Amaral (PT-MS) - sempre que o montante a ser regularizado for superior a US$ 100 mil uma instituição financeira deve agir como intermediária. No documento anterior, um substitutivo do próprio Delcídio, o valor era US$ 50 mil.

A preocupação dos bancos, que deram sugestões ao novo texto, é que não seja criada qualquer obrigação que os onere ou responsabilize pelos dados dos contribuintes, segundo uma fonte de mercado que preferiu não ser identificada.

"Quem faz fiscalização financeira é o Estado. Não se terceiriza a fiscalização", concorda Eduardo Salomão Neto, sócio-fundador do escritório Levy & Salomão Advogados. Seria violado o artigo 21 da Constituição, defende, que atribui à União a competência de "fiscalizar as operações de natureza financeira".

O texto anterior obrigava a instituição financeira, juntamente com a pessoa física ou jurídica, a manter em boa guarda e ordem, enquanto não prescritas, eventuais ações pertinentes, cópia dos documentos necessários para aderir ao programa, assim como apresentá-los sempre que exigido pela Receita Federal. No novo projeto, as instituições financeiras sumiram desse parágrafo.

Já o significado de outro trecho do projeto é menos consensual. O novo texto define que a regularização de ativos no exterior deve ocorrer por meio de instituição financeira autorizada a funcionar no País "à vista das informações prestadas pelo contribuinte", frase que entrou no lugar de "mediante documentação comprobatória".

Para uma fonte de banco, é sinal de que a demanda do mercado surtiu efeito e, do texto em análise no fim do primeiro semestre legislativo à última versão, elaborada a partir de conversas com o mercado, a responsabilidade das instituições financeiras foi reduzida.

"O papel do ponto de vista de responsabilidade do banco ficou muito suavizado", concorda Marcelo Bandeira de Mello, sócio do Cepeda, Greco & Bandeira de Mello Advogados. Para ele, na nova versão, a responsabilidade do banco é a que já tem hoje: avaliar se a declaração faz sentido com base no histórico do seu cliente.

Já na opinião de Salomão Neto, ainda que o novo texto pareça à primeira vista deixar de exigir que a instituição comprove algo, ao colocá-la como intermediária automaticamente ela assume um papel que não deveria. Ao ter acesso aos documentos, ela passa a ter responsabilidade na operação, acredita. "Que sentido teria apenas mostrar a ela documentos e levá-los depois embora?", diz. "Ou seja, apenas se substituiu expressão mais clara por outra mais ambígua", completa.

Na visão do responsável jurídico por uma instituição financeira global, que preferiu não ser identificado, o uso da expressão "à vista das informações financeiras prestadas pelo contribuinte" poderia ser visto, de fato, como uma dispensa da instituição de fazer alguma averiguação adicional, ou obter de forma independente documentos que não tiverem sido apresentados pelo contribuinte. Para ele, entretanto, a regra não muda em nada a responsabilidade que a instituição financeira tem.

Todas as instituições que trabalham com câmbio, diz a fonte, têm um manual operacional para esse procedimento, que relaciona os documentos que precisam ser apresentados em cada uma das situações. Cabe a ela verificar a documentação, exigindo, por exemplo, uma avaliação patrimonial atual de um imóvel quando esse for o bem em questão. O difícil e isso já existe hoje, diz, é encontrar o equilíbrio entre o dever de investigar que a instituição financeira já tem e a transformação dela em uma delegacia de polícia, ou em uma filial da Receita Federal.

Pretender que a instituição financeira pudesse ter alguma isenção de responsabilidade, apenas pelo fato de que os recursos repatriados têm origem em dinheiro anistiado, diz a fonte, não parece realista e nem seria justificável à luz dos compromissos assumidos institucionalmente pelo Brasil junto aos organismos internacionais ligados ao combate à lavagem de dinheiro.

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Luciana Seabra | Valor

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