Acordo de acionistas e administradores: vinculação e deveres fiduciários

A exequibilidade de acordos de acionistas que procuram aumentar o controle dos signatários sobre a administração das sociedades é tema de amplo debate doutrinário. O ponto principal da discussão é a vinculação ou não do administrador às diretrizes advindas dos acionistas signatários.

A vinculação dos administradores ao acordo de acionistas é tratada pelo artigo 118 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976 ("Lei das S.A."), que estabelece que votos com infração a acordos de acionistas devidamente arquivados não deverão ser computados pelo presidente da assembleia ou órgão deliberativo e que ausências às assembleias ou reuniões e abstenções de voto asseguram à parte prejudicada o direito de votar pelo administrador eleito com os votos da parte ausente ou omissa.

Em uma interpretação literal e isolada da norma, seria possível concluir que os administradores estariam de fato vinculados às disposições de acordos de acionistas devidamente arquivados, e, como consequência, que deveriam votar de acordo com as decisões dos acionistas que os elegeram, sob pena de terem seus votos desconsiderados pelo presidente da reunião e serem destituídos do cargo.

Mas é necessário analisar a conveniência das diretrizes demandadas pelos acionistas em relação às atividades desenvolvidas pela companhia, uma vez que, ainda que a ordem emanada não seja ilegal, ela pode ter consequências negativas para a companhia.

Em uma interpretação sistemática da norma, e considerando que os administradores possuem o dever legal (e não apenas a faculdade) de observar a legislação vigente, é possível defender que a subordinação deles aos acordos de acionistas deve estar limitada às previsões legais, aos interesses legítimos da companhia e à função social da empresa.

A própria Lei das S.A. estabelece que os administradores estão vinculados aos seus deveres fiduciários, e os obriga a agir com diligência e lealdade e a não intervir em caso de conflito de interesse. Assim, os administradores eleitos nos termos de acordo de acionistas têm os mesmos deveres dos demais administradores. Descumpridos esses, podem ser responsabilizados.

Apesar de os administradores estarem de fato vinculados a disposições do acordo de acionistas da sociedade, nos termos do artigo 118, eles não podem deixar de cumprir com seus deveres fiduciários e obrigações estabelecidas na lei e no estatuto, de forma que, caso haja um descompasso entre as diretivas dos acionistas e os deveres fiduciários, os últimos deverão prevalecer.

Tem-se verificado uma tendência em diversos acordos de acionistas de grandes companhias abertas de aplicar isoladamente o disposto no artigo 118, subordinando de forma absoluta os administradores e seus deveres fiduciários às diretrizes dos acionistas, o que pode gerar a responsabilização deles por prejuízos causados à companhia, aos acionistas não signatários ou até mesmo ao mercado.

Os administradores eleitos nos termos de acordos de acionistas devem sempre atentar às obrigações fiduciárias estabelecidas em lei e analisar caso a caso as diretrizes advindas dos acionistas signatários do acordo, para afastar responsabilidade por eventuais prejuízos causados à companhia, a acionistas não signatários ou até mesmo ao mercado.

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Autores L&S

Christian Galvão Davies

Christian Galvão Davies

Sócio
Fabiana Fadel Guillot

Fabiana Fadel Guillot

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