Imposto sobre Grandes Fortunas: entre a necessidade e a ineficiência
Houve reaquecimento recente do debate sobre aumento da arrecadação tributária sem penalizar a parcela mais vulnerável dos contribuintes. Nessa equação, estratégia óbvia seria a instituição do Imposto Sobre Grandes Fortunas (IGF), que é previsto na Constituição Federal (CF), mas depende de Lei Complementar para regulamentá-lo.
Muito embora não seja assunto novo no meio tributário, o IGF causa grande movimentação na sociedade pelos contornos políticos que possui, levando a debates sobre a maior tributação daqueles considerados mais ricos. Porém, é sempre bem-vinda uma abordagem sóbria e menos apaixonada que levante a pergunta: IGF é mesmo eficiente?
O tema já foi objeto do estudo nº 463/2015, elaborado pela Consultoria Legislativa do Senado Federal, que mostrou seu baixo potencial arrecadatório, estimado na ordem dos R$ 6 bilhões anuais. Como o IGF seria um tributo lançado por declaração, arrecadação adequada exigiria grande esforço do Estado para implementar fiscalização eficaz, aumentando os gastos públicos e tornando ainda menor o saldo positivo dessa tributação.
Experiências na Europa mostram que a instituição do IGF pode ser acompanhada de frustração quanto à arrecadação, pois alguns dos alvos desse imposto podem ter alternativas legais para evitar sua incidência, tal como a retirada de patrimônio/recursos do País em certos casos, o que pode trazer mais prejuízos que benefícios à economia como um todo no médio e no longo prazo. A Alemanha, por exemplo, extinguiu imposto similar ao IGF em 1997, após má experiência. O estudo feito pela Consultoria Legislativa do Senado mostra que a fuga de capitais e os custos de fiscalização foram determinantes para a desistência de países europeus.
Outra grande dificuldade é encontrar um consenso quanto a definição razoável do montante que deve ser considerado como “grande fortuna” para fins do IGF, havendo grande disparidade entre os projetos de lei existentes quanto a essa questão.
Além do aspecto econômico, as novas propostas surgidas no contexto da pandemia de COVID-19 preocupam quando vistas sob o prisma jurídico, pois atropelam princípios tributários fundamentais. Chama atenção o Projeto de Lei Complementar (PLP) nº 38/2020 do Senador Reguffe (PODEMOS), que prevê cobrança imediata do IGF enquanto durar o estado de calamidade pública, bem como vinculação direta de sua arrecadação ao custeio de ações de combate à COVID-19 e de um fundo social de apoio aos mais pobres. Embora nobres, essas propostas desrespeitam os princípios da anterioridade nonagesimal e de exercício (art. 150, III, alíneas “b” e “c”, da CF) e ignoram a impossibilidade de destinar a receita do imposto a fundo de combate à pobreza ou a ações e serviços públicos de saúde que ultrapassem o gasto mínimo previsto no art. 198, §2º, da CF (art. 167, IV, da CF).
É certo que medidas precisam ser tomadas para aumentar a capacidade de ação do Governo Federal em período difícil, mas é necessário agir com cautela para evitar ineficiências econômicas e abusos jurídicos.