Os direitos e a participação de bondholders em recuperações judiciais

Processos de recuperação judicial vêm ganhando relevância cada vez maior no Brasil, não apenas por sua quantidade mas pelas cifras envolvidas. Alguns casos indicam que um grupo de credores tende a figurar como detentor de parcela expressiva da dívida das sociedades submetidas ao processo de recuperação: os titulares de instrumentos de dívida emitidos fora do Brasil (bondholders).

Tais instrumentos, usualmente nomeados bonds,são emitidos no mercado internacional pela própria sociedade operacional brasileira ou, comumente, por subsidiária constituída no exterior com específico propósito de captar esses recursos e os transferir à sociedade brasileira via contrato de mútuo. Assemelham-se à figura das debêntures: conferem direito de crédito contra o emitente e podem contar ou não com garantias reais ou pessoais. Além disso, assim como o agente fiduciário desempenha um papel de representação dos debenturistas, um trustee sediado no exterior tipicamente representará os interesses dos bondholders (com o registro de que algumas emissões não contam com trustee, mas com agent investido de poderes mais limitados).

A lista de credores apresentada pelo conglomerado Odebrecht em seu pedido de recuperação judicial, por exemplo, indica aproximadamente US$3 bilhões em bonds; isso equivale a quase 20% da dívida total alegadamente sujeita aos efeitos da recuperação, que é de pouco mais de R$ 65 bilhões ou US$ 17 bilhões (excluídos os créditos entre coligadas).

Em recuperações judiciais, os credores se dividem em quatro classes gerais: (i) titulares de créditos trabalhistas ou decorrentes de acidentes de trabalho; (ii) titulares de crédito com garantia real; (iii) titulares de créditos quirografários ou privilegiados; e (iv) credores qualificados como microempresa ou empresa de pequeno porte. Bonds geralmente são créditos quirografários, ainda que sua escritura de emissão (indenture) preveja garantias pessoais ou prioridade em relação a outras dívidas. Serão classificados como créditos com garantia real apenas se contarem com garantia reconhecida como tal pelo direito brasileiro, como penhor ou hipoteca.

Entretanto, a dívida dos bonds não estará sujeita ao processo de recuperação judicial na medida em que contar com garantia constituída sob a forma de alienação ou cessão fiduciária de ativo. Nesse caso, desde que o juízo a cargo do processo de recuperação não considere que tal ativo é essencial às atividades do devedor e suspenda temporariamente sua venda, o trustee poderá executar a garantia e distribuir o produto da venda aos bondholders para liquidação da dívida nas condições pactuadas.

Credores da mesma classe devem em regra ser tratados igualmente, e bondholders não podem ser prejudicados em comparação com credores nacionais pelo só fato de serem estrangeiros. Não obstante, a jurisprudência progrediu no sentido de permitir que os devedores estipulem subclasses em seus planos, agrupando credores com interesses ou créditos homogêneos desde que haja racionalidade econômica para tanto.

Isso abre oportunidades para bondholders – e debenturistas. Eles devem considerar a possibilidade de negociar com o devedor a criação de subclasses para seus bonds (ou debêntures), o que pode propiciar condições mais favoráveis dentro da respectiva classe. Por exemplo, na recuperação judicial da Oi foi criada subclasse para os bondholders prevendo a troca de créditos por participação societária expressiva na companhia.

Bondholders sujeitos à recuperação judicial podem se fazer representar de forma individual ou por meio do trustee (ou agent, se o caso). A relação nominal de credores apresentada pelo devedor normalmente indica o trustee como titular da totalidade dos créditos decorrentes da emissão, e nesse caso será o trustee a pessoa legitimada a comparecer em juízo para defender os interesses dos bondholders e votar o plano. Em razão disso, problemas podem se originar da ausência de instruções em tempo hábil ao trustee ou da discordância entre os bondholders a respeito da estratégia a ser adotada.

Porém, a jurisprudência reconhece o direito dos bondholders de atuar individualmente, caso seja de seu interesse. Para que possa comparecer em juízo e votar em nome próprio na assembleia de credores, o bondholder deve se identificar e requerer individualização de seu crédito.

A amplitude da influência dos bondholders em recuperações judiciais varia conforme seu grau de ativismo durante o processo. A partir da análise de aproximadamente 15 recuperações judiciais ocorridas desde 2005 envolvendo bondholders, constatam-se dois pontos: esse grupo tem pouco a ganhar caso permaneça inerte; e a atuação individual dos bondholders pode ser mais proveitosa que a participação por meio do trustee ou agent. Ao atuar individualmente, os bondholders são capazes de elaborar e implementar sua própria estratégia, valorizando assim o preço de seus papéis no mercado ou alcançando outros objetivos que porventura tenham. No mais, dada a semelhança entre bonds e debêntures, essa é uma reflexão que também vale para credores debenturistas.

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Autores L&S

Luiz Roberto de Assis

Luiz Roberto de Assis

Sócio
Rafael Zabaglia

Rafael Zabaglia

Sócio

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