Sanções civis pelo uso de trabalho análogo à escravidão

O Brasil declarou guerra às relações de trabalho análogas à escravidão e a quaisquer condições degradantes de trabalho, assumindo o compromisso de combatê-las por meio de leis rigorosas. Para além de consequências nos âmbitos trabalhista e criminal, nos últimos anos o Brasil vem desenvolvendo estrutura legal com vistas a punir o uso de trabalho escravo também na esfera civil.

Discutimos a seguir três exemplos de sanções civis pelo uso de trabalho análogo ao de escravo que revelam os esforços do Brasil no sentido de erradicar todo tipo de exploração ilegal de mão de obra.

Expropriação de imóveis

Emenda Constitucional promulgada em 2014 incluiu a exploração de trabalho escravo dentre as causas que autorizam a expropriação de imóveis urbanos ou rurais. Propriedades nas quais essa prática seja detectada serão revertidas à reforma agrária e à moradia popular, sem qualquer indenização a seu proprietário.

A eficácia dessa norma é controvertida. Certas normas constitucionais dependem de regulamentação posterior por meio de normativo infraconstitucional para que produzam efeitos. Até o momento, o dispositivo alterado em 2014 não foi regulamentado.

Contudo, considerando que a norma visa a proteção de direitos fundamentais como a dignidade humana, entendemos que sua eficácia não se subordina a regulação futura. Nesse sentido, a depender do caso concreto, proprietários de imóveis em que seja localizada exploração de trabalho escravo estão sujeitos a expropriação sem contrapartida financeira.

Cassação do registro do ICMS

Diversos Estados brasileiros, como São Paulo, passaram a cassar o registro de contribuinte de ICMS (Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação) de empresas que se beneficiam direta ou indiretamente do uso de trabalho escravo em qualquer etapa da cadeia produtiva.

A cassação do registro do ICMS inviabiliza na prática a continuidade de qualquer atividade da empresa. Apesar da morosidade do Poder Judiciário e da usual demora em se obter uma decisão não sujeita a recurso, a determinação do cancelamento do registro do ICMS pode ocorrer no curso do processo judicial e ter efeitos imediatos, ou seja, não dependerá de uma decisão final e irrecorrível para produzir efeitos.

Além disso, a sanção pode ser estendida aos acionistas ou quotistas da pessoa jurídica, na medida em que a decisão judicial também os proíba de fazer negócios no mesmo ramo pelo período de dez anos, contados a partir da cassação do registro da empresa da qual eram titulares. Estão impedidos, inclusive, de solicitar a inscrição de nova empresa cujo campo de atuação seja o mesmo da empresa condenada.

Proibição de concessão de crédito rural

À empresa que se utiliza de condições de trabalho análogas à escravidão também pode ser vedada a concessão de financiamento rural. A Resolução nº 3.876/2010 do Conselho Monetário Nacional (CMN) proíbe instituições financeiras brasileiras de oferecer qualquer modalidade de crédito rural ou arrendamento mercantil rural a pessoas físicas ou jurídicas inscritas no Cadastro de Empregadores que mantiveram trabalhadores em condições análogas à de escravo – a chamada “lista suja” do Ministério da Economia.

Instituições financeiras e seus administradores responsáveis que concedam crédito rural a cliente relacionado na “lista suja” sujeitam-se a sanções administrativas perante o Banco Central, que vão de admoestação e multa até a proibição de atuar como administrador de instituições financeiras por até vinte anos, além de indenização civil. Em 2019, por exemplo, o Banco da Amazônia foi condenado pela Justiça do Trabalho do Maranhão a pagar R$200.000,00 (duzentos mil reais) a fundo de proteção ao trabalhador a título de dano moral coletivo em virtude da concessão de crédito rural a empregador cadastrado na “lista suja”.

Autores L&S

Angela Di Franco

Angela Di Franco

Sócia
Leonardo Feres Montino

Leonardo Feres Montino

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